quinta-feira, 8 de agosto de 2013

Aumento, desconto e o “conto” do desconto


Aumento, desconto e o “conto” do desconto
(Artigo organizado por Marcos Antônio Colins, professor de Matemática da Rede Estadual de Ensino do Maranhão)

O novo preço do livro

O custo de reimpressão de um livro depende de dois fatores: papel e gráfica. Suponhamos que o gasto com papel represente 60% daquele custo e as despesas com gráfica os restantes 40%. Exemplificando: se a reimpressão de um livro custar R$ 10 000,00 então R$ 6 000,00 serão devidos ao papel e R$ 4 000,00 à gráfica. Imaginemos que, no prazo de um ano, o preço do papel sofra um aumento de 25,9% e os custos com gráfica 32,5%. O problema é saber de quanto deverá subir o preço do livro.
Este é um exemplo prático, simples e interessante, de aplicação do conceito de média ponderada. Os pesos desta média são as porcentagens com que cada uma das duas componentes, papel e gráfica, pesam no custo de reimpressão do livro. Portanto, o aumento do preço do livro deve ser calculado assim:

[60 × 25,9% + 40 × 32,5%]/100 = 28,54%.

Como dar descontos

Um aluno que trabalhava no setor de vendas de uma fábrica de calçados, viu-se diante do seguinte problema: a empresa dava aos clientes um desconto de 10% para compras à vista; dava ainda mais 10% de desconto para compras acima de 2 000 e abaixo de 10 000 pares de sapatos ou 15% para compras acima de 10 000 pares.
Sua dúvida era a seguinte: se um cliente comprasse à vista, 12 000 pares, ele deveria dar primeiro 10% de desconto (pela compra à vista) e logo depois 15% (pela compra acima de 10 000 pares) ou poderia dar logo um desconto total de 25%?
Esta foi a maneira como ele encarou o problema e, apesar de ter a sensação de que não dava na mesma, ele não se sentia seguro quanto a isso.
Analisemos a situação. Seja C o valor da compra. Recebendo um desconto de 10% seu cliente pagaria 0,90C pela mercadoria. Sobre esse valor, sendo dado agora um desconto de 15%, o valor a ser pago passaria a ser 0,85 × 0,90C = 0,765C. Isto significa que o cliente pagaria 76,5% do valor de C, o que equivale a um desconto único de 23,5%.
Portanto, para seu cliente, era mais vantajoso um desconto de 25%!
Restava saber, na hora da decisão, a quem beneficiar: a empresa ou o cliente?
Situações deste tipo, envolvendo porcentagens, aparecem com frequência. É comum as pessoas somarem porcentagens indevidamente. Em épocas de inflação acelerada, por exemplo, a inflação de um trimestre não é a soma das inflações de cada um dos três meses. Assim, por exemplo, se as inflações de janeiro, fevereiro e março fossem, respectivamente, de 12%, 11% e 14% a inflação acumulada do trimestre não seria de 12% + 11% + 14% = 37%.
O cálculo correto deve ser feito assim: se p é o preço de uma mercadoria em fim de dezembro, então, em fim de janeiro ela custará: 1,12p. Em fim de fevereiro: 1,11 × 1,12p e em fim de março: 1,14 × 1,11 × 1,12p ≅ 1,42p.
Isto significa um aumento aproximado de 42%.

O conto do desconto

Quando a inflação era muito alta, ao comprar pneus novos para seu carro, um professor de Química precisou optar entre dois planos de pagamento:
  1. 50% de desconto sobre o preço da tabela, para pagamento à vista;
  2. 35% de desconto sobre o preço da tabela, para pagamento em 3 vezes.
O vendedor lhe mostrou a vantagem do segundo plano. Pagando em 3 vezes você está pagando 15% a mais. Em 3 meses, isto dá 5% ao mês, o que, para a época, era de fato um juro baixíssimo.
De imediato, o professor percebeu que este raciocínio estava errado. Na verdade, o pagamento em 3 vezes, correspondia a um financiamento em 2 meses e não três. Precisamos perceber que uma das parcelas é entrada. Então o juro mensal seria 7,5% e não 5%.
Entretanto, este não é ainda o raciocínio correto. Usando sua calculadora financeira programável, ele concluiu que o juro mensal, embutido na segunda proposta de pagamento, era de cerca de 33%!!
Vamos raciocinar. Seja p o preço da tabela do pneu. No primeiro plano de pagamento ele pagaria 0,50p; no segundo, pagaria 0,65p, sendo 0,65p/3 de entrada, uma primeira prestação de 0,65p/3 e a segunda prestação de 0,65p/3.
Após pagar a entrada ele ficava devendo para a loja 0,50p – 0,65p/3 = 0,85p/3.
Este é o valor efetivamente financiado: 0,85p/3.
Se a taxa mensal de juros é j, então após um mês sua dívida passa a ser 0,85p/3 + 0,85p/3 × j = (1 + j) × 0,85p/3.
Aí ele paga a primeira prestação e fica devendo (1 + j) × 0,85p/3 – 0,65p/3.
Após outro mês esta dívida passa a ser [(1 + j) × 0,85p/3 – 0,65p/3] × (1 + j).
Então ele paga a segunda prestação e quita a dívida, ou seja, [(1 + j) × 0,85p/3 – 0,65p/3] × (1 + j) – 0,65p/3 = 0.
Simplificando obtemos: 85(1 + j)2 – 65(1 + j) – 65 = 0, ou seja, 17(1 + j)2 – 17(1 + j) – 17 = 0.
Resolvendo esta equação do segundo grau, na incógnita 1 + j, e considerando apenas a raiz positiva obtemos 1 + j ≅ 1,3368, donde j ≅ 0,3368 = 33,68%
Para fazer justiça àquele comerciante, deve-se acrescentar ainda que o mesmo não tinha consciência disto tudo. A defesa que fazia do segundo plano de pagamento, era, até certo ponto, sincera. Achava até que, neste segundo plano, estava perdendo dinheiro, em face de uma inflação muito alta. Sem perceber, ao invés de perder, ganhava, e muito, com ela. É claro que este comentário não se generaliza para todos os especuladores.

[Contato: macolins@gmail.com]

Nenhum comentário:

Postar um comentário