Blitz
da Educação: o poder do bom professor e de uma boa gestão
(Artigo
organizado por Marcos Antônio Colins, professor de Matemática da
Rede Estadual de Ensino do Maranhão)
Em um livro
publicado por Gustavo Ioschpe em 2004, ele idealizou um índice cuja
aplicação permite dar notas de zero a 10 às escolas públicas com
base em informações sobre o aprendizado dos alunos e suas taxas de
aprovação medidas pelo Ideb, o Índice de Desenvolvimento da
Educação Básica.
No mês de maio
(2011), ele acompanhou uma equipe do JN no ar – Blitz da Educação.
Em cada cidade, visitada por sorteio, foram visitadas a pior e a
melhor escola pública classificadas segundo aquele índice. Foram
sorteadas as cidades de Novo Hamburgo (RS), Vitória (ES), Caucaia
(CE), Goiânia (GO) e Belém (PA). Não se pode dizer que essas dez
escolas visitadas são uma amostra representativa da educação
brasileira, visto que a seleção não foi totalmente aleatória, mas
se aproximam bastante do quadro geral do país. As visitas não
trouxeram nenhuma grande surpresa para quem é familiarizado com a
educação brasileira, mas adicionam uma concretude que às vezes
falta nas pesquisas outrora divulgadas.
A seguir, um
resumo de alguns aprendizados e experiências resultantes das visitas
acima citadas:
A importância
da Direção/Gestão
Quando falamos em
educação, focamos na figura do professor, que é o ator principal
do processo e é quem tem contato direto com os alunos. Mas, assim
como em qualquer organização humana, por trás dos talentos
individuais é preciso haver uma gestão que oriente (bem) os
esforços e dê um sentido ao todo. Nas escolas, é o diretor
(gestor). É impressionante como é possível notar grandes
diferenças entre as escolas através de pequenas diferenças de
discurso dos diretores. Nas escolas ruins, os diretores geralmente
não sabiam quantos alunos estudavam lá. Diziam coisas como “uns
700”, “na faixa de 350”. Nas escolas boas, o diretor sabia o
número exato e respondia sem titubear. Nas escolas ruins, há uma
certa frouxidão sobre aquilo que deve ser ensinado e como. Os
diretores, invocando a “democratização”, ou “o processo
coletivo” da “construção do saber”, deixam os professores à
vontade para que definam o que é melhor para seus alunos. Nas
escolas boas, há disciplina — sem repressão, apenas ordenamento.
Nas ruins, é uma balbúrdia (= grande desordem, confusão, gritaria,
algazarra).
Envolvimento
dos pais
As escolas boas se
esforçam para atrair os pais para dentro do ambiente escolar. Na
escola de Novo Hamburgo (E.M. Jacob Kroeff Neto), as reuniões com
pais eram marcadas para as 7 da noite. Muitos pais faltavam. A
diretora ligou para os faltantes para descobrir o porquê da
ausência. Ouviu que as reuniões eram feitas muito cedo, não dava
tempo chegar do trabalho. As reuniões então passaram a acontecer
uma hora mais tarde. O quórum aumentou. Na escola boa de Goiânia
(E.M. Francisco Bibiano de Carvalho), a diretora espera os pais todos
os dias, no portão da escola, tanto na entrada quanto na saída dos
alunos, e conversa com quem ali estiver. Desde o 1º ano, a família
recebe um boletim com notas e comentários extensos ao fim de cada
bimestre. Na escola ruim de Belém, ao contrário, há um total
descaso para com os pais. As reuniões são marcadas durante a manhã
ou à tarde, horários impossíveis para qualquer trabalhador. A
direção e os professores comunicam eventuais problemas dos filhos
por bilhetes — mesmo sabendo que a maioria dos pais é de
semianalfabetos. Cumprem os rituais. Apenas isso.
Cultura do
sucesso versus
tolerância
ao fracasso
Já dizia Ambrose
Bierce que o dicionário é o único lugar em que sucesso vem antes
de trabalho. As boas escolas obtêm desempenhos mais altos porque
trabalham duro para isso. E o primeiro passo dessa caminhada é ter a
expectativa do sucesso, com metas ambiciosas. Os diretores e
professores das escolas que funcionam desejam que seus alunos
aprendam. Quando o aluno não aprende, eles chamam os pais, criam
aulas de reforço, insistem. Chamam para si a responsabilidade. Já
as escolas fracassadas aceitam o insucesso como normal — quando não
põem a responsabilidade sobre um ente externo, fora do controle da
escola. Pode ser “o sistema”, os políticos, os pais, os alunos
ou a sociedade. Nunca é com eles. A terceirização da
responsabilidade produz indolência. Na escola com Ideb baixo de
Goiânia, os alunos estão praticamente analfabetos — no 4º ano!
Perguntados se faziam algum trabalho de reforço, a diretora
respondeu, orgulhosa: “Sim, três horas diárias!”. A aula era
ministrada em área semicoberta por um tatame e compartilhada pelos
alunos com alguns instrumentos musicais. Não havia lousa nem
material didático. Metade do tempo de aula era usada para lições
de tae
kwon do.
Dedicar metade da aula para a atividade esportiva, com alunos
analfabetos no 4º ano, é uma confissão de abandono.
Uso do
material didático
Nas boas escolas,
professores e alunos usam o material didático como apoio, o que dá
uma organização ao processo de ensino-aprendizagem. Na escola boa
de Caucaia (E.M. Celina Sá Morais), usam-se um material de um
programa do governo do estado para alfabetizar alunos na idade certa.
Professores e alunos são conduzidos por um caminho que dá certo,
sem a necessidade de reinventar a roda a cada dia. Nas más escolas,
ou o material didático não é utilizado ou o professor o utiliza
para substituir a aula. Na mesma Caucaia, na escola ruim, a atividade
dos alunos consistia em ler o livro didático e responder às
perguntas do próprio livro. A professora ficava ali olhando... Na
escola ruim de Novo Hamburgo, o professor se limitava a entregar
jornais aos alunos. Uma aluna ficou olhando as propagandas de
clínicas de emagrecimento...
Monitoramento
e Avaliação
Nas boas escolas,
há avaliação constante e formal.
O poder do bom
professor
É impressionante
a diferença que um professor faz, mesmo nas condições mais
precárias. Em Vitória, uma professora chamada Alecsandra escrevia
na lousa em ótima caligrafia. Falava baixo e atenciosamente com os
alunos. Engajava-os fazendo perguntas a todos. Com três meses de
aula, muitos já estavam demonstrando sólidos sinais de
alfabetização. Qualquer professor que culpe “o sistema” deveria
passar por uma aula assim para voltar a acreditar em si mesmo.
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Nota:
Todos
os professores (educadores) sensatos entendem (e defendem) que as
virtudes integrantes de uma educação bem orientada são aprendidas
no lar e na escola. Daí a necessidade (urgente) de atrair os pais
para o ambiente escolar. No entanto, esse envolvimento
(família-escola) deve ser feito de forma racional e contínua, a fim
de que a comunidade escolar progrida de maneira eficaz. Trata-se,
evidentemente, de uma parceria. E para que tal parceria tenha êxito
é importante (e por que não dizer, fundamental e indispensável)
disciplinar e ordenar aquilo que deve ser ensinado e como. Não se
trata de reprimir a atuação do professor, mas sim, conforme já
dito, disciplinar o ensino de acordo com o currículo escolar e as
necessidades dos alunos, a fim de que os mesmos venham a superar
obstáculos, ainda que estes se remetam a dificuldades anteriores (ou
que já deveriam ter sido superadas).”
(Marcos
Antônio Colins)
[Contato:
macolins@gmail.com]
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